As restries da Unio Europia carne bovina brasileira geraram um cenrio indito no mercado internacional: o Uruguai, que at 2007 exportava volumes pequenos para o bloco, dobrou os embarques do produto este ano e est vendendo cortes nobres a preos recordes. A situao beneficia empresas brasileiras, como Marfrig e Bertin, que esto no pas vizinho e tm conseguido exportar carne
in natura para a Unio Europia a partir de suas unidades uruguaias.
Com o Brasil praticamente fora do mercado e a Argentina limitando as vendas externas de carne, o Uruguai chegou a exportar fil mignon para a UE por US$33 mil por tonelada, preo jamais alcanado. Enquanto isso, o Brasil negocia o mesmo corte em mercados como Rssia, Hong Kong e pases do Oriente Mdio por, no mximo, US$11 mil a tonelada - isto , um tero do valor que o Uruguai consegue no mercado europeu.
As restries da Europa - que definiu, no comeo do ano, que s vai importar carne bovina proveniente de animais de fazendas brasileiras rastreadas e credenciadas - fez o Brasil vender muito menos carne in natura ao bloco no primeiro semestre deste ano: foram apenas 33,4 mil toneladas (equivalente-carcaa) no perodo, 77% abaixo das 145,7 mil toneladas do mesmo perodo de 2007, de acordo com dados da Secex compilados pela
Scot Consultoria.
J o Uruguai exportou entre janeiro e o ltimo dia 12 de julho, um volume de 54 mil toneladas (equivalente-carcaa) de carne bovina ao bloco, quase o dobro de igual intervalo de 2007, conforme nmeros preliminares do Instituto Nacional de Carnes (INAC), rgo de estatsticas ligado ao governo uruguaio.
O analista Rafael Tardguila, da Blasina & Tardguila Consultores Asociados, de Montevidu, observa que h pouca carne para ser vendida no mercado, por isso o Uruguai ampliou os embarques Europa. Alm disso, o pas tambm deslocou parte de suas exportaes dos Estados Unidos para a Rssia, que est demandando mais carne este ano e por isso pagando mais. Um efeito imediato dessa demanda por carne maior tambm a valorizao do boi no mercado uruguaio.
O fato de as exportaes brasileiras para a UE serem restritas o principal motivo para a recente valorizao dos preos da carne bovina no mercado internacional, mas o produto j vinha em alta, observa um analista. Em outubro do ano passado, antes de a UE impor as restries ao Brasil, frigorficos brasileiros j conseguiram exportar fil mignon por mais de US$20 mil por tonelada, conseqncia da demanda aquecida e da menor oferta de carne.
No h dvida de que o quadro favorece as empresas que esto no Uruguai, mas poder exportar Europa a partir do pas vizinho compensa apenas parte da perda por no exportar a partir de unidades no Brasil, diz Ricardo Florence, diretor de relaes com investidores do Marfrig. A empresa j hoje a maior em carne bovina do Uruguai e a maior exportadora do produto do pas. Ele diz que a estratgia do Marfrig, desde o incio das restries europias, sempre foi atender os clientes a partir de Uruguai e Argentina.
Questionado se a possibilidade de exportar UE pelo Uruguai reduz a mobilizao para que o Brasil volte a exportar, Florence afirma que o Marfrig tem plantas habilitadas a vender ao bloco e que o "Brasil tem se esforado" para ampliar a lista de fazendas aptas a fornecer animais para abate. Hoje o nmero de menos de 90 propriedades.
Marco Bicchieri, diretor de estratgia comercial e de relaes institucionais do Bertin, observa que, depois de disparar, os preos dos cortes para a Europa comeam a recuar. Chegou a um limite, e as frias [europias] reduzem a demanda, afirma. Com isso, os novos negcios com fil do Uruguai, por exemplo, j saem na casa de US$28 mil, de qualquer forma, um preo elevado.
Para Bicchieri, a alta do boi no mercado brasileiro acaba desestimulando o pecuarista a aderir ao sistema para exportar UE, mas ele defende uma atuao mais forte do Brasil junto a Bruxelas para tentar reverter as restries.
O avano do Uruguai na Europa pode ser at cobiado, mas preciso considerar que os volumes exportados pelo pas so pequenos comparados ao que o Brasil poderia vender. E a razo simples: o rebanho bovino uruguaio de apenas 11,6 milhes de cabeas, os abates crescem pouco e por isso as empresas trabalham com capacidade ociosa. Esse quadro limita a possibilidade de elas ampliarem as vendas ao exterior, que j respondem por 75% do total que o pas produz.
O preo em alta do boi por causa da demanda aquecida outro limitador neste momento. O analista Tardguila observa que o preo est firme tambm por causa da entressafra no Uruguai, que vai at outubro. Levantamento da
Scot Consultoria mostra que os preos da arroba no Uruguai saram de US$32,10 no comeo do ano para US$51,30 atualmente. No mesmo perodo, o preo no Brasil saiu de US$40,23 para US$55,94.
A alta do boi no Uruguai j fez o Bertin reduzir os abates metade em sua unidade no pas, onde tem a capacidade de 800 animais por dia, de acordo com Bicchieri.
Fonte:
Valor Econmico. Agronegcios. Por Alda do Amaral Rocha. 24 de julho de 2008.
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