Já considerado o setor mais afetado pela crise dentro do agronegócio, as indústrias frigoríficas estão desativando unidades de abate para se adequarem a um problema que atinge duas pontas: o da oferta de boi, que está escassa, e a das exportações, que estão caindo em volume e em preço.
Na média dos principais estados produtores de carne bovina, o fechamento de unidades frigoríficas com inspeção federal atinge quase 30% do setor. Mas não é só esse mal que aflige essa indústria.
A tendência é que as empresas de pequeno e médio portes entrem em reais dificuldades de continuar operando. É que a pressão de oferta no mercado interno acirra a disputa doméstica e, em alguns estados, frigoríficos de maior porte já pressionam os preços de venda para níveis abaixo do custo de produção.
O maior número de fechamento de unidades frigoríficas está em Mato Grosso, estado com o maior rebanho comercial do País.
Do total de 42 frigoríficos com inspeção federal deste estado, 12 foram desativados, principalmente do segundo semestre para o início deste ano. E esse número é maior, se considerar as indústrias habilitadas apenas na venda estadual.
Do total de 25, cinco ou seis desativaram seus abates nos últimos meses, segundo conta Luiz Antônio Freitas, presidente do Sindicato das Indústrias Frigoríficas de Mato Grosso (Sindifrigo-MT). “Há um achatamento da margem de lucro das empresas, pois as exportações estão em queda e acaba sobrando carne no mercado interno”, explica Freitas.
Segundo fontes do mercado, os frigoríficos de maior porte instalados em Mato Grosso estão com estratégia agressiva para abocanhar uma fatia do mercado local e há uma forte pressão sobre os preços, que estão sendo negociados abaixo do custo de produção.
A informação é de que o quilo da carcaça casada, cujo custo para produzir é de R$5,10 no Estado, está sendo vendida pelos frigoríficos a R$4,80, valor que em dezembro estava em R$5,40.
O indicador da grande São Paulo, que é de referência para a maior parte do País, a maior oferta também está pressionando os preços para baixo, o que ocorreu mesmo em época de festas natalinas ou em início de mês, quando normalmente o consumo aumenta com a economia irrigada com o recebimento dos salários.
De acordo com dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP), o quilo da carcaça casada (carne com osso) no atacado da grande São Paulo caiu 12% desde meados de novembro. Naquela época, o quilo valia R$5,66, valor que veio recuando para atingir em meados de dezembro, auge das festas de fim de ano, R$5,06.
Em 16 de dezembro estava em R$5,05. Ontem, o quilo foi cotado em R$4,96.No exterior, a retração de preços - e de rentabilidade dos frigoríficos - é ainda mais intensa. Dados da Secex, compilados pela Scot Consultoria, mostra que o valor do quilo de carne bovina (em moeda nacional) para a Rússia caiu 45% desde outubro, de R$7,08 para R$5,08 em janeiro deste ano.
Para a União Européia, que é o mercado que melhor paga pelo produto (entre os que o Brasil tem acesso) esse valor recuou 34% de R$15,01 para R$9,8. “Essa crise é sem precedentes. Com a restrição na União Européia, os frigoríficos que exportavam ao bloco direcionaram o produto a outros mercados que pagam menos. Se já está ruim com essa queda de preço, imagine esse recuo em mercados que já pagam mal”, pondera Fabiano Tito Rosa, da Scot Consultoria.
Com essa retração nos preços, fica difícil para os frigoríficos se manterem em regiões onde os preços da matéria-prima estão elevados, conforme explica Mário Macedo, superintendente de compra de gado do frigorífico Mercosul.
O grupo, que nos últimos três meses fechou duas unidades - uma em Naviraí (MS) e outra em Paiçandu (PR) - direcionou o abate dessas plantas para outras indústrias, sobretudo em Goiás e no Rio Grande do Sul.
Ele explica que faltam animais habilitados para exportar para a UE e, por isso, a empresa teve que redirecionar a outros mercados, como Oriente Médio, Venezuela, Rússia e outros 60 países. Alguns desses mercados pagam até 20% menos por alguns cortes do que a UE, como o filé bovino. “Há casos em que exportamos sem margem para manter mercado e tirar o produto do estoque”, explica Macedo.
Ele explica que a escassez do boi é um problema para os frigoríficos, mas a falta de comprador a preços rentáveis também afeta o setor, pois a indústria fica sem condições de pagar um preço maior ao pecuarista, desestimulando a atividade.
Além dos frigoríficos que já estavam com problemas financeiros antes da crise, como o Frigoestrela, Quatro Marcos e Margem, a desativação de unidades atinge grupos de médio e grande porte, como o Independência, que fechou uma planta em Campo Grande em janeiro.
Há outras empresas menos conhecidas, como River Alimentos, de Coxim (MS), Campo Oeste Carnes, de Campo Grande (MS) e Frigorífico Iguatemi, de Iguatemi (MS). “Nunca houve tanto frigorífico desativado. A situação é extremamente preocupante”, avalia Rosa.
Fonte: Jornal Gazeta Mercantil. Agronegócios. 17 de fevereiro de 2009.