O ano de 2015 ao que tudo indica ficará marcado positivamente na cabeça do pecuarista por registrar, se não o maior, um dos maiores ciclos de valorização nos preços do boi gordo da pecuária brasileira. Os preços do boi gordo vêm atingindo recorde em valores reais. Descontando-se pelo Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) de fevereiro de 2015, o valor da arroba chegou a R$ 147,97 no dia primeiro de abril. O recorde anterior tinha sido registrado em 27 de novembro de 2014 (R$ 147,79 por arroba), segundo toda a série histórica medida pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), órgão da Esalq/USP, de Piracicaba, no interior de São Paulo.
Apenas nos três primeiros meses do ano, já são mais de 30% de alta seguida e indicadores do boi futuro sinalizando para valores ainda mais elevados na entressafra. O clima de ânimo, que trouxe de volta a esperança para o pecuarista, é algo que para os analistas surge como consequência natural diante da atual perspectiva de precificação para a arroba, momento que também pede atenção do produtor ao mercado e muito cuidado na hora de reinvestir seus lucros.
Alex Lopes, zootecnista e consultor de mercado da Scot Consultoria, destaca que o risco está na forma como muitas vezes o pecuarista tira suas conclusões, sem considerar aspectos importantes, levando-se apenas ao movimento de precificação da arroba. "Um olhar menos atencioso ao atual cenário econômico e político do País pode levar a grandes equívocos, já que o ano está começando muito bom para o pecuarista. É preciso ficar atento também quanto ao consumo", diz. Ao considerar que o boi representa aproximadamente 80% do custo total do frigorífico, existe neste momento um elo bastante estrangulado desta cadeia produtiva, que é a indústria. "Ela está pagando caro para adquirir sua matéria-prima e não está encontrando formas de posicionar seus produtos de maneira competitiva ao varejo", afirma.
Novo ajuste de rota
Há dois anos, a seca histórica ocasionou a falta de pasto para alimentar o gado e trouxe consequências sérias que afetou o rebanho de uma maneira geral, deixou reflexos mais visíveis naquela que vista como a fase mais sensível da criação, a cria. Mortalidade maior de bezerros no pré-desmama, redução do número de matrizes prenhas e maior intervalo entre partos das fêmeas foram apenas algumas das intercorrências registradas.
Como resultado, o setor amargou a diminuição da produtividade média dos rebanhos, que se estima bateu em duas arrobas por animal na região Centro Sul - Paraná, São Paulo, Triângulo Mineiro, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso - que responde por 55% da produção de carne bovina do País. "Essa perda corresponde a um mês de abate registrado em toda a indústria frigorífica em âmbito nacional", diz Sergio De Zen, responsável pela pesquisa sobre os mercados de proteína animal do Cepea. Segundo o pesquisador e professor, a palavra de ordem é agir com cautela. "O pecuarista deve aproveitar o momento de fluxo de caixa positivo e fazer a renovação do seu plantel de matrizes, por exemplo, produto que certamente terá seu preço valorizado", afirma De Zen.
Na opinião dele, se ao invés da euforia, o sentimento que prevalecer na cabeça do pecuarista neste momento for o da prudência, e se seu olhar se manter, não no lucro de curto prazo, mas sim nos investimentos que trarão ganhos sustentáveis em longo prazo, as chances de elevar seus ganhos ainda mais no futuro próximo estão garantidas. Estudo publicado pela Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ) sobre a potencialidade da pecuária mostra que a atividade poderá duplicar sua produção e quintuplicar as exportações de carne nas próximas três décadas. Os dados mostram que em 2012, o Brasil produziu 8,5 milhões de toneladas de carne, consumiu 7 milhões/t e exportou 1,5 milhão/t, faturando US$ 5 bilhões. A ABCZ aponta que a melhoria genética e das pastagens e o crescimento do mercado levarão o País a produzir 17,6 milhões/t de carne, em 2042, ficando o consumo interno em 8,5 milhões/t e as exportações pulando para 8,5 milhões/t, em uma movimentação total de US$ 28 bilhões.
Antônio Pitangui de Salvo, diretor da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ) e presidente da comissão de bovinocultura de corte da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), acredita no crescimento da atividade e a cautela na hora de falar sobre o momento vivenciado pela pecuária, destacando que o Brasil enfrenta uma crise sem precedentes, mas que a criação é uma atividade que está presente nas raízes da cultura do nosso País. "O criador acredita que os setores da pecuária, não apenas do corte, mas os de leite continuarão avançando. E isso, graças ao trabalho de melhoramento genético por meio de seus principais programas, do trabalho da Embrapa que vem melhorando a qualidade das pastagens e, principalmente, do pecuarista aprendendo que seu pasto precisa ser melhorado, que o uso de genética melhorada é fundamental, que o investimento em modernização da gestão traz ganhos em longo prazo", diz o dirigente da ABCZ, que também atua no melhoramento genético. A entidade organizará entre os dias 03 a 10 de maio, a 81ª edição da Expozebu, em Uberaba (MG).
Reposição segue incerta
O ano para o confinador começou com a divisão do mercado, que por um lado apresenta cenário de valorização garantida nos contratos futuro e por outro as incertezas em relação à continuidade da valorização dos preços, pagos na indústria que já sofre os efeitos da crise financeira. A aposta está sendo na produção que deve mais uma vez crescer em média 7,5%, elevando a oferta de rebanho para 4,5 milhões de cabeças, estimativas de números nacionais.
Recentemente, a Associação Nacional dos Confinadores (Assocon) divulgou os dados do seu levantamento e o resultado mostra uma tendência pelo fechamento do gado já a partir de março, com 74% do rebanho já negociado de alguma maneira pelo produtor. A previsão para 2015 é que sejam confinados 828 mil animais por um grupo de 85 pecuaristas, ante os 770 mil em 2014.
Para Bruno de Jesus Andrade, gerente executivo da Assocon, o boi magro valorizado é neste momento o fator que mais está pesando na decisão final do confinador. "A preocupação maior recai sobre o segundo semestre do ano e no consumo que já mostra sinais de enfraquecimento, ao que tudo indica não deve melhorar", diz.
Mercado externo aquecido, será?
No cenário externo, a piora das economias de países que historicamente mais importam carne do Brasil é o fator que mais preocupa os setores ligados à cadeia produtiva, que teme uma queda no consumo motivada, principalmente, pela baixa histórica nos preços do petróleo. Rússia, Hong Kong e Países do Oriente Médio que respondem por quase a metade da carne que sai dos portos brasileiros encabeçam a lista das economias em recessão, neste momento.
Apesar das atenções, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), entidade que representa o segmento de exportações de carne, aposta em novo recorde de vendas ao exterior em 2015. A indústria de carne bovina brasileira registrou um faturamento de US$ 432 milhões em fevereiro, com embarques de mais de 98 mil toneladas. Com relação a janeiro, os números mostram recuperação, com crescimento de 1,39% em faturamento e 1,90% em volume. Já no acumulado do ano, somando os meses de janeiro e fevereiro, foram exportadas 194 mil toneladas de carne bovina brasileira - 28% menos do que no mesmo período do ano passado. Somado o faturamento nos dois primeiros meses do ano chega a um valor de US$ 859 milhões, queda de 26% em relação a 2014.
De acordo com o presidente da Abiec, Antônio Jorge Camardelli, apesar disso o setor teve recentemente a reabertura de importantes mercados, como Iraque e África do Sul, além de boas perspectivas com o fim definitivo dos embargos de China, Arábia Saudita e Japão. Além da possibilidade de abertura para os Estados Unidos. "Isso tudo nos permite manter a expectativa de atingir novo recorde em 2015", diz Camardelli.
Fonte: Revista Conexão Rural, edição n° 3, de abril de 2015. Texto de Márcio Mingardo.
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