São Paulo, 23/09/2015 - Os frigoríficos brasileiros devem apresentar margens de lucro mais saudáveis no terceiro trimestre de 2015, melhora que é devida em larga medida ao fechamento de dezenas de fábricas ao longo do ano. O ajuste na produção tornou possível à indústria pressionar produtores para segurar os preços do boi, sua principal matéria-prima.
O indicador Cepea/Esalq, que considera a cotação da arroba em São Paulo, referência nacional, tem média de R$ 142,18 desde julho, valor 2,54% menor do que a do primeiro semestre: R$ 145,89. O ajuste produtivo também permitiu fechar negócios melhores com atacadistas. "A diminuição da demanda por gado fez com que frigoríficos conseguissem esfriar os preços do boi gordo e a redução geral na oferta de carne fez os preços ao atacado ganharem maior firmeza", afirma o analista Hyberville Neto, da Scot Consultoria, ao Broadcast. No caso de JBS, Marfrig e Minerva, as campeãs do segmento, os ganhos podem ser ainda maiores.
A Scot tem observado melhora nas margens de comercialização da indústria, que são mensuradas diariamente. Em seus cálculos, a consultoria considera as vendas na Grande São Paulo e as cotações da arroba do animal castrado, mas não inclui custos. O indicador Equivalente Scot Desossa começou o terceiro trimestre a 19,9% e subiu a 23,2% até o dia 23 de setembro. No início de abril, o percentual estava em 11,3%. O índice inclui a carne desossada e outros itens (couro, sebo, miúdos, derivados e subprodutos). "O indicador da desossa já está próximo da média histórica, que é de cerca de 22%, o que é positivo para a indústria", observa Neto. O Equivalente Físico, que inclui apenas os cortes dianteiros, traseiros e a ponta de agulha, saiu de -5,1% em 1º de julho para -2,7% em 23 de setembro. No começo de abril, o porcentual era de -10,9%. O índice, que normalmente é negativo, mostra que a indústria não consegue ser rentável apenas com a venda destes três produtos.
A recuperação das margens de comercialização reflete os movimentos de preços da arroba e da carne bovina nos últimos meses. O terceiro trimestre registrou o menor valor nominal para o ano: R$ 139,03, em 12 de agosto. O valor é R$ 11,62 menor do que a máxima de 2015, que foi de R$ 150,64, em 20 de abril. Enquanto isso, os preços da carne no atacado da Grande São Paulo ficaram praticamente estáveis no terceiro trimestre, passando de R$ 9,65/quilo da carcaça casada em julho a R$ 9,70/quilo ontem, mesmo ante a crise doméstica. A cotação do Cepea, porém, tem subido ante o início de abril, quando a referência era de R$ 9,06/quilo.
De acordo com Neto, da Scot, frigoríficos que trabalham com parte de sua oferta garantida e com preços previamente combinados com os pecuaristas podem apresentar desempenho ainda melhor. Tais instrumentos são geralmente utilizados pelas grandes companhias do setor. JBS, Marfrig e Minerva também conseguem preços menores no mercado à vista, por representarem um menor risco de crédito aos olhos do pecuarista.
Espera-se que o avanço das exportações e a alta do dólar também favoreçam o resultado dessas empresas, que são responsáveis por 94% das vendas externas de carne bovina do Brasil. Os meses de julho e agosto registraram os maiores volumes de exportação do ano, 111.800 toneladas e 112.400 toneladas, respectivamente, embora ainda tenham ficado aquém dos resultados obtidos nos mesmos períodos de 2014. Já em setembro, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) indica ritmo maior de exportação, de modo que o mês pode ser o primeiro do ano a superar os números de 2014.
Previsões
Na última temporada de balanços, JBS, Marfrig e Minerva já antecipavam margens melhores para o terceiro trimestre. Em teleconferência de resultados no mês passado, o presidente global da JBS, Wesley Batista, teve de justificar margens mais estreitas do que as de seus concorrentes e tentou convencer investidores de que os próximos números seriam melhores. "Estamos assistindo a um ajuste na indústria brasileira para se adequar à disponibilidade de oferta de gado, então estamos bem mais otimistas para os próximos trimestres", afirmou. "Teremos uma recuperação de margens já no terceiro trimestre", garantiu.
A unidade Mercosul da JBS reportou margem Ebitda de 5,2%, ante resultado de 10,1% entre abril e junho de 2014. A Marfrig Beef e a Minerva tiveram resultados maiores que o da rival em virtude de ganhos de mercado em exportação, dentre outros fatores. A Marfrig reportou margem ajustada de 9,7%, ante 8,1% no mesmo período de 2014. A Minerva também ficou em 9,7%, mas teve retração de 0,2 ponto porcentual ante o mesmo período do ano passado. O índice se refere ao porcentual de receitas transformadas em Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) e não deve ser confundido com a margem de comercialização da Scot, embora ambos indicadores ofereçam uma noção do desempenho de um frigorífico.
O diretor financeiro (CFO) da Minerva, Edison Ticle, inclusive previu que a arroba não teria pressão de alta na entressafra, o que seria algo atípico. "Nossa pesquisa interna indica acréscimo de 5% no gado disponível vindo do confinamento. Temos uma visão de que os preços da arroba do boi não vão sofrer pressão de alta. Achamos até que pode ter uma queda adicional", afirmou em coletiva de imprensa no mês passado.
A projeção não se revelou tão acertada. Associações e entidades do mercado do boi têm revisto para baixo suas estimativas para o confinamento em 2015 e a oferta restrita de gado já obriga a indústria a operar com maior capacidade ociosa. Neste cenário, os contratos futuros da BM&FBovespa voltaram a prever valores de R$ 151/arroba para a entrega em novembro - o que pode ser um indício de que o período de margens confortáveis pode ser mais curto que o esperado. Outro elemento de preocupação é a greve dos fiscais agropecuários, que pode se prolongar tempo o suficiente para afetar os próximos resultados.
Fonte: Estadão Conteúdo, por Renato Oselame.
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