O Brasil conseguiu um espetacular resultado no seu saldo comercial, graças a um
volume exportado de US$118 bilhões em 2005. A questão que tem intrigado muita
gente é que o dólar caiu ao longo do ano. Pela visão mais simplista, taxa de câmbio
valorizada faz as exportações caírem – por tornar os produtos brasileiros mais caros no exterior – e desvalorizada faz com que elas subam. Ora, se o câmbio valorizou-se, porque as exportações subiram tanto? Terá a taxa de câmbio perdido a importância para definir as vendas para o exterior? Terá a economia sofrido uma revolução no ano passado, tornando a teoria econômica uma relíquia do passado?
A resposta é não, claro que não.
Um produto brasileiro será competitivo no mercado internacional se o preço dele em
dólares for igual ou menor que o praticado por seus concorrentes. E os produtores
terão interesse em vendê-los se os preços, em reais, cobrirem os custos incorridos em sua produção, também em reais. Essa equação, custos em reais e receitas em dólares, depende da taxa de câmbio mas, também, do comportamento dos preços em cada moeda.
Vejamos um exemplo: vamos supor que o Brasil produza apenas um produto para
exportação e digamos que seja açúcar. Vamos supor que os produtores tenham um
bom lucro quando eles vendem as sacas a R$ 30,00 no exterior. Se a taxa de câmbio
for de R$3,00, isso implica que o preço internacional deve ser de US$10,00 a saca,
para que os produtores brasileiros vendam sua produção no exterior. Se essa relação
se mantém inalterada, as exportações podem subir ao longo do tempo. Mas se o preço internacional do produto cair para US$8,00, a receita obtida pela venda seria de R$24,00. Essa queda do preço internacional poderia tornar a produção inviável e,
portanto, faria com que as exportações caíssem.
Uma forma de compensar essa queda de preços seria a DESVALORIZAÇÃO da taxa câmbio até o ponto em que o produtor continuasse recebendo seus R$30,00. A nova taxa de câmbio seria de R$3,75, com uma desvalorização de 25%, valor aproximado da desvalorização do preço do açúcar no mercado internacional. O país manteria seu saldo comercial, mas com uma taxa de câmbio mais desvalorizada e, talvez, com uma inflação maior.
Esse tipo de ajuste acorreu muitas vezes no Brasil. São exemplos históricos as décadas de trinta e de oitenta.
Mas pode ocorrer o contrário: o preço do açúcar pode subir no mercado internacional. Digamos que o preço suba de US$10,00 para US$15,00. A receita das vendas dos produtores subiria dos R$30,00 para R$45,00. Ocorre que nesse nível de receita a produção aumentaria muito e as exportações subiriam. Se o Brasil praticar o câmbio flutuante, as vendas internacionais vão gerar um enorme fluxo de dólares e a taxa de câmbio pode se valorizar (a oferta ficaria maior que a demanda).
Até que ponto a taxa de câmbio poderia se valorizar sem prejudicar o volume de exportações? Até o ponto onde os produtores recebessem a receita de R$30,00 por tonelada, ou seja, até R$2,00. A taxa de câmbio sofreria uma forte apreciação, mas o saldo comercial não seria prejudicado.
Esses eventos nos explicam que é a taxa de câmbio real e não a nominal que define o valor do comércio internacional. Ela é resultado da relação entre preços internos,
preços externos e a taxa de câmbio nominal.
O que aconteceu com o Brasil – e não apenas com ele, mas diversos países – em
2005, foi que os preços de seus produtos mais importantes no exterior subiram
fortemente e ainda se mantém elevados. A valorização da taxa de câmbio não foi
suficiente para eliminar os efeitos dessa alta de preços sobre as receitas em reais da
maior parte dos exportadores brasileiros. Se a taxa de câmbio ficasse com sua cotação de 2004, todo o ganho dos preços internacionais seria repassado aos exportadores.
Mas a apreciação da taxa de câmbio permitiu que esse ganho fosse dividido com
diversos agentes. O mais provável é que os trabalhadores tenham se beneficiado com a valorização (pelo aumento em dólares de sua renda), as empresas multinacionais que têm seus lucros medidos em dólares, bancos e outras instituições financeiras e importadores.
Mas houve setores que perderam: todos os setores que vendem ao exterior produtos cujos preços não subiram no mercado internacional. Eles tiveram suas receitas em reais diminuídas. Também perderam os produtores brasileiros que sofrem a concorrência dos produtos importados, já que os estrangeiros podem vender
seus produtos aqui mais baratos em reais, mantendo as receitas em dólares.
O saldo comercial brasileiro teve como fonte principal o crescimento mundial, que
permitiu que os preços internacionais subissem. A valorização da taxa de câmbio
apenas permitiu que os ganhos obtidos com o comércio fossem redistribuídos entre os vários setores da economia brasileira.
Acreditar que a economia brasileira está sendo comandada por novos paradigmas e que a boa teoria econômica ficou obsoleta é desconsiderar os elementos mais básicos dessa mesma teoria.
Fonte: Global Invest Asset Management
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